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Desabafos,,

Da vida não quero muito. Quero apenas saber que tentei tudo o que quis, tive tudo o que pude, amei tudo o que valia a pena e perdi apenas o que, no fundo, nunca foi meu.

Desabafos,,

Da vida não quero muito. Quero apenas saber que tentei tudo o que quis, tive tudo o que pude, amei tudo o que valia a pena e perdi apenas o que, no fundo, nunca foi meu.

Afinal era solidão

M. Martins, 17.11.20

Afinal era solidão 

 

Aqui a uns dias aconteceu uma situação que me fez parar e  pensar.

Estava eu absorvido na leitura de um dos vários  livros que sempre tenho a mão ali pela sala, neste  caso era o Milénio, de Tom Holland, quando toca o meu telemóvel, o celular, como dizem os nossos amigos do outro lado atlântico.

Com alguma ansiedade atendi, ansiedade e receio, porque da última vez que senti tal ansiedade o “celular”deu-me um péssima notícia, falarei disso noutra altura;, levei o aparelho ao ouvido mesmo sem ver quem era o remetente e ouço do outro lado uma voz  masculina que não me soou familiar.” Estou, és tu meu caro”! exclamou a voz , sou, disse eu, mas  por mais que tentasse  não conseguia  identificar a voz  nem  adivinhar com quem estava  a falar,  a voz continuava a não me soar familiar. Olá , daqui fala o Zé, sabes, eu já andava faz algum tempo para te ligar mas a vida nem sempre nos deixa fazer aquilo que queremos, agora é uma coisa depois vem outra, tu, tu sabes como é .Sabes, a minha mulher, lembras-te dela,? a minha Zezé,! faleceu, pois foi, decerto tu ainda não sabias, pois não, eu sei que se soubesses já me tinhas ligado. Olha, sabes, desde aí que pra qui estou sozinho, os meus filhos parece que se esqueceram de mim, eu sei que a vida não está fácil, é a pandemia, são os empregos, as crianças, tu já sabes que eu tenho netos, pois sabes, mas olha eu quase não os vejo, já pouco me lembro das feições deles, olha eu nem sei se são empregados ou desempregados, não sei não, não  me dizem nada, olha, tu por acaso não tens estado com eles, se estiveres fala-lhes de mim”. Eu disse que não, não tenho estado com eles,e sim, se os vir direi!

Eu acho que o Zé já não ouviu o que eu disse porque a chamada caiu, não sei se foi o Zé que desligou ou se ficou sem bateria no “celular”. Eu ainda penso que o Zé me estaria a ligar de um telemóvel, podia ser de um fixo, não sei porque no meu telemóvel não apareceu qualquer número.

Foram três ou quatro minutos de conversa em que praticamente só um falou, o Zé. Eu quero deixar uma promessa ao Ze ;, olha Zé, quando encontrar os teus filhos vou-lhes falar de ti e desta conversa que tivemos, e  Zé , não tenhas problemas em ligar, liga sempre que precisares de falar, prometo ser o ouvinte que “sempre fui”!!

O Zé não vai voltar a ligar, não que não queira ou precise, o Zé não volta a ligar porque ele não tem o meu número na memória e eu também não posso ligar ao Zé porque o número dele é privado. De uma coisa eu tenho a certeza, eu não conheço o Zé e ele também não me conhece a mim.

Afinal o Zé só precisava de falar com alguém,  a escolha, que foi  ao acaso, acabou por recair em mim, ou melhor, no meu telemóvel.

Afinal o Zé só precisava de falar com alguém porque sofre de uma doença chamada solidão!,

um abraço Zé, fica bem e liga sempre que precisares,,

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Manuel Martins

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